COMO UMA CANÇÃO DE NATAL DE BOB GELDOF DEU ORIGEM AO LIVE AID
“Do They Know It’s Christmas?” marcou o início de uma revolução humanitária na música pop
Em 1984, a criação de uma canção natalina liderada por Bob Geldof, vocalista da banda The Boomtown Rats, deu início a uma das maiores mobilizações filantrópicas da história da música. No ano seguinte, essa iniciativa culminaria no Live Aid — festival beneficente que completa 40 anos em 2025 e redefiniu o papel da música pop na luta por causas humanitárias.
Mas, antes de entendermos como a icônica “Do They Know It’s Christmas?” nasceu, é preciso conhecer a trajetória de Bob Geldof — um artista que transformou indignação em ação global.
BOB GELDOF: DO PUNK ROCK À AÇÃO HUMANITÁRIA
Nascido em 1951, na Irlanda, Geldof ganhou notoriedade como vocalista da The Boomtown Rats, banda que emergiu no fim dos anos 1970 com uma mistura de punk rock e crítica social. Seu maior sucesso veio em 1979 com “I Don’t Like Mondays”, uma canção escrita após um tiroteio em uma escola nos EUA, onde a jovem autora do ataque afirmou que agiu porque “não gostava das segundas-feiras”.
A música, que chegou ao topo das paradas no Reino Unido, revelou um lado mais profundo de Geldof: um compositor atento às questões sociais, capaz de transformar tragédias em reflexão artística. Essa sensibilidade seria levada a outro nível nos anos seguintes.
1984: A MÚSICA QUE NASCEU DE UMA REPORTAGEM
No final de 1984, ao assistir a uma reportagem da BBC sobre a crise de fome devastadora na Etiópia, Bob Geldof ficou profundamente impactado. Decidido a agir, procurou o músico Midge Ure (da banda Ultravox) e, juntos, criaram “Do They Know It’s Christmas?” com o objetivo de arrecadar fundos e chamar atenção para a tragédia.
A música foi gravada em um único dia com a participação de estrelas da música britânica — como Bono, George Michael, Sting, Phil Collins, Boy George, Paul Young, entre outros — reunidos no supergrupo Band Aid. O lançamento foi um sucesso absoluto: liderou as paradas, vendeu milhões de cópias e arrecadou cifras expressivas para ações emergenciais na África.
1985: LIVE AID, O DIA EM QUE O MUNDO PAROU PARA OUVIR
O impacto de “Do They Know It’s Christmas?” levou Geldof a sonhar mais alto. Em 13 de julho de 1985, ele concretizou uma ideia ambiciosa: o Live Aid, um festival simultâneo com palcos em Londres (Wembley Stadium) e Filadélfia (JFK Stadium), transmitido ao vivo para mais de 100 países, com uma audiência estimada em 1,5 bilhão de pessoas.
O line-up foi histórico: Queen, U2, Elton John, Madonna, David Bowie, Led Zeppelin, The Who, Paul McCartney, Bob Dylan, entre outros. O evento arrecadou mais de US$ 125 milhões, destinados ao combate à fome na África. E, mais do que isso, estabeleceu um novo padrão para o engajamento social na indústria do entretenimento.
A INSPIRAÇÃO DO OUTRO LADO DO ATLÂNTICO: USA FOR AFRICA
O sucesso do Band Aid inspirou, nos EUA, a criação do projeto USA for Africa, idealizado por Lionel Richie, Quincy Jones, Harry Belafonte e Ken Kragen. Em janeiro de 1985, após a cerimônia do American Music Awards, um grupo estelar se reuniu para gravar “We Are the World”, com nomes como Michael Jackson, Stevie Wonder, Bruce Springsteen, Diana Ross, Tina Turner, Cyndi Lauper, Ray Charles e muitos outros.
Bob Geldof também estava presente na gravação, como símbolo do movimento que ele mesmo havia iniciado. O single tornou-se um marco da música beneficente, consolidando a ideia de que artistas podem — e devem — usar sua visibilidade para mudar realidades.
2025: O LEGADO DE 40 ANOS DO LIVE AID
Quatro décadas depois, o Live Aid permanece como um dos eventos mais emblemáticos da história da música. Seu impacto ultrapassou a arrecadação financeira: ele redefiniu o papel do artista na esfera pública. Desde então, o dia 13 de julho é celebrado como o Dia Mundial do Rock — em homenagem ao festival que provou que a música pode, sim, transformar o mundo.
Outros projetos vieram na esteira do Live Aid, como o Live 8, realizado em 2005, com nova geração de artistas e o mesmo espírito de mobilização global.
O PODER DE UMA CANÇÃO
Tudo começou com uma música escrita às pressas, em resposta ao sofrimento de um povo distante — “Do They Know It’s Christmas?”, até hoje executada no Natal, continua lembrando ao mundo o poder de uma ideia coletiva.
O Live Aid segue como referência de engajamento e empatia. Mostra que, quando a arte encontra propósito, seu alcance vai muito além do entretenimento.
BOB GELDOF: UM ARTISTA COM VOZ E PROPÓSITO
Ao longo dos anos 1980, Geldof se consolidou não só como músico, mas como um dos maiores ativistas humanitários do showbiz. Foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz e recebeu o título de cavaleiro honorário do Império Britânico. Mesmo com lançamentos musicais esporádicos, seu maior legado continua sendo o impacto social que gerou com sua voz — e com sua indignação transformada em ação.
Com canções como “I Don’t Like Mondays” e “Do They Know It’s Christmas?”, Geldof provou que compor é, também, um ato político e humanitário — e que a música tem o poder de ecoar onde discursos não chegam.